Chegou ao fim, no último 6 de Julho de 2015, uma série que vale a pena ver e rever: My mad fat diary. Para quem não conhece a série, pode ter a pergunta inicial de “Como assim um diário doido e gordo?” suscitada pelo título. Do mesmo jeito que um seriófilo (tentativa de criar uma palavra para viciado em série) deve pensar em um milhão de jeitos para como eu conheci a sua mãe “How I met your mother”, tudo pelo título. Os títulos parecem ter essa capacidade de dar um primeiro passo na caracterização do produto em mercado. E certamente My mad fat diary adjetiva bem o desenvolvimento da trama que acabou de acabar.
Focando
na primeira temporada, a fim de caracterizar de maneira geral a série, em My
mad fat diary temos a figura de Rachel Earl, uma adolescente acima do peso de
Lincolnshire da década de 90, época dos grandes Blur e Oasis, que se vê dentro
de um conflito diário. Seu maior conflito é si mesma, no que tange a sua
autoestima e disposição para lidar com a vida. Recém saída de um hospital
psiquiátrico, Rachel tem de adaptar-se novamente à vida fora dos muros
hospitalares, aprendendo a lidar com questões relacionadas a sua pessoa e o
mundo, que parece censurá-la subjetivamente devido a sua aparência e as suas
vontades.
Por
estar em constantes estados de depressão ou baixa autoestima, Rae (redução
carinhosa de seu nome Rachel) frequentemente sofre as consequências desse
estado. Sendo assim, ela deve aprender a lidar com o fato de, com certa
frequência, machucar fisicamente a si mesma como meio de retirar prazer da dor
ou, então, de comer besteiras desgovernadamente ou, ainda, colocar-se inferior
ao mundo.
Para
livrar-se de seus fantasmas, Rachel conta com três apoios, importantíssimos,
aos quais ela vai ganhando confiança ao longo da trama e que na numeração que
seguem não estão em lista de maior importância um em relação ao outro:
1.
Mãe e Dr. Kester: Kester é o terapeuta de Rae. Aparentemente um homem
melancólico e sério, Kaster tem por objetivo ajudar pacientes que contam com
alterações psicológicas a lidarem com seus problemas de vida. Funciona como
ponto de reflexão para Rae, embora muitas vezes ela só perceba a importância
das reflexões em terapia após as sessões ou no desenrolar dos episódios. Além
de Kester, a mãe de personagem que, como toda mãe, está disposta a dar seu
apoio, mesmo sendo severa às vezes e um pouco alheia a Rae.
2.
The gang: A gangue de Rae, ou melhor, seus amigos. Estes Rae adquire ao longo
da trama, passo a passo, através de idas a um pub vizinho e saídas. Ela
constrói um verdadeiro vínculo de amizade com eles, que foram introduzidos a
ela por Chloe, sua amiga de infância a qual Rae procura restabelecer os laços
de amizade após a saída do hospital. São os elos principais da trama, onde giram
as principais situações em que se envolve Rae e os diversos clímax das três
temporadas da trama.
3.
O entrecruzamento diário-pessoa: Os episódios da série são narrados pela
própria Rae, de modo que a série inteira é um diário no qual, vira-e-mexe, na
tela são simuladas notas mentais da personagem, pensamentos, fragmentos. E, o
mais interessante, o diário que é a narrativa da série contém outro diário: O
diário físico, no qual em uma cena ou outra aparece Rae escrevendo nele. Na
verdade, o diário louco e gordo – seja aquele físico que aparece em algumas
cenas, quanto aquele que é a cena narrada por Rachel, quanto o título da série
- parece mais uma metonímia do que é ser a Rachel Earl. Ele é uma parte de um
todo muito mais complexo, que se reflete não só fisicamente na personagem (a
loucura e a obesidade, recordando o próprio título My mad fat diary), mas
também no arquivar das situações vividas por Rachel, que só podemos entender os
detalhes dos acontecimentos graças a suas notas mentais e recursos sonoros – a
trilha sonora da série é ótima, contando com os clássicos do rock dos 90s.
Muita
tristeza e melancolia? Muito tom de Morrisey? Na verdade, não. Por incrível que
pareça – e essa é característica mais fantástica da série – é que My mad fat
diary consegue lidar com os problemas de uma adolescente depressiva e de baixa
autoestima com muito humor. Isso porque Rachel, apesar de todos os problemas, é
uma adolescente engraçada, irônica e com um quê de sarcasmo. As notas mentais
apresentadas na tela para o seriófilo possuem sempre observações cômicas acerca
da situação em que Rachel está no momento da cena, uma vez que essas notas
estão associadas às opiniões mais íntimas de Rachel: o seu comentário acerca de
uma determinada coisa do mundo ou sobre si mesma ou até mesmo o seu desejo por
rapazes, o que é uma constante comum, sobre o lindo e maravilhoso Finn Nelson.
Não só as notas mentais, que aparecem na tela, mas também as situações em si
descritas nas cenas em diálogos o são também, sejam entre Rachel e sua mãe,
Rachel e seus amigos, etc.
É
na mistura do humor com o dramático que a série se sustenta. Sem dúvidas, sem
um recurso ao humor, o seriado seria só mais um daqueles dramas que estamos
acostumados. Faz parecer que, dessa mistura, uma ideia fique bem expressa em
Rachel. Essa ideia significa por si que o humor é a face misteriosa que divide
espaço com o triste, de modo que estamos ligados ora a momentos de desespero,
que são suplantados por ironia, sarcamos e humor; ora por momentos de ironia,
sarcasmo e humor, suplantados pelo desespero. E é justamente por alternar
nesses dois pólos que a série é vitoriosa em manter a sua história, explorando
temas e assuntos importantes à vida humana – os problemas da mente – até os
temas mais bobos, porém reveladores: os desejos e impressões de uma adolescente
de Lincolnshire na década de 90, Rachel Earl.
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